Chegam vindas de longe, atravessam desertos, mares e tempestades para regressar a um lugar onde já foram felizes. Um beiral, um recanto de parede, um telhado qualquer. Regressam para recomeçar.
Na fotografia, um ninho de andorinhas-das-chaminés (Hirundo rustica) acolhe cinco crias famintas, à espera da próxima refeição. É um retrato do início da vida: frágil, instintivo, confiante. O ninho, feito de barro, palha e saliva, é uma verdadeira obra de engenharia natural. As andorinhas recolhem dezenas de pequenos fragmentos de lama e constroem, camada a camada, uma estrutura resistente e acolhedora. Fazem-no com uma precisão admirável, quase sempre nos mesmos locais, como se soubessem que a continuidade também é um valor ecológico.
Estas aves são migradoras de longa distância. Nascem na Europa, viajam até à África tropical para passar o inverno, e regressam todos os anos aos seus territórios de reprodução. São fiéis ao local onde nasceram, uma qualidade que as torna particularmente vulneráveis às transformações do território.
E é aqui que a poesia da imagem ganha um peso mais sério: as andorinhas estão a desaparecer. Em Portugal, como em vários países europeus, as populações têm vindo a diminuir nas últimas décadas. As causas são conhecidas: perda de habitat, destruição de ninhos, escassez de insetos provocada pelo uso intensivo de pesticidas, mudanças nos padrões climáticos e urbanização crescente. Quando o mundo muda depressa demais, nem todas as espécies conseguem adaptar-se.
Apesar disso, continuam a confiar em nós. Constroem os seus ninhos perto das nossas casas, das escolas, das igrejas, dos cafés. Partilham connosco o espaço, mesmo quando não as recebemos de braços abertos. É comum que os ninhos sejam destruídos por quem não quer lidar com os vestígios que deixam no chão. Mas essa convivência, ainda que por vezes incómoda, é também um privilégio — o de poder assistir de perto ao ciclo da vida.
Do ponto de vista ambiental, a presença de andorinhas é um bom sinal. Estas aves alimentam-se de insetos em pleno voo, controlando naturalmente populações de mosquitos e outras pragas. Uma andorinha pode capturar centenas de insetos por dia, prestando um serviço silencioso, mas essencial ao equilíbrio dos ecossistemas.
Mas para além da sua utilidade ecológica, há nelas uma força simbólica difícil de ignorar. Representam o regresso, a renovação, a fidelidade a um lugar. Num tempo em que tudo parece passageiro, a andorinha lembra-nos que voltar é possível e que recomeçar, mesmo com barro e palha, é sempre um ato de esperança.
Ver um ninho de andorinhas é mais do que observar aves. É testemunhar um pacto ancestral entre o mundo natural e o humano. Um pacto que, hoje, exige de nós mais cuidado, mais respeito, e mais vontade de partilhar o espaço que habitamos.
Levantar os olhos e reparar nestes inquilinos silenciosos pode ser o primeiro passo para voltarmos a fazer parte do equilíbrio que eles nunca deixaram de procurar.