EDITORIAL – EDIÇÃO 11 | ABRIL 2025

EDITORIAL – EDIÇÃO 11 | ABRIL 2025

A História de um povo é feita de encontros, de influências e de caminhos que se cruzam. Nesta edição, cruzamos os Caminhos de Santiago e de Fátima com o legado islâmico em Portugal. Duas abordagens completamente distintas, mas que, no seu âmago, traduzem a essência da civilização – a procura do sagrado, a busca pelo conhecimento e o respeito pela diversidade.

Os Caminhos de Santiago, trilhados por peregrinos ao longo dos séculos, são um reflexo de uma unidade cultural e espiritual que sempre existiu entre Portugal e a Galiza. Chegar a Santiago de Compostela é mais do que atingir um destino; é testemunhar a força de um percurso feito de fé, partilha e superação. Ao percorrer essas ruas históricas é impossível não ficar impressionado com a grandiosidade da catedral, e com a alegria da chegada estampada nos rostos cansados dos caminhantes.

Mas há também um legado que nos relembra quão rica e sofisticada foi a civilização que nos antecedeu, sobretudo no sul do país – o islâmico. Em Portugal, a presença muçulmana deixou marcas indeléveis na língua, na arquitetura, nos costumes e na própria estrutura das cidades. Mas para compreendermos a verdadeira dimensão desse legado, devemos olhar para os lugares onde essa herança atingiu o seu esplendor. Sevilha e Granada são exemplos magníficos dessa sofisticação. Em Granada, a Alhambra ergue-se como um poema esculpido em pedra, com os seus intrincados arabescos, pátios exuberantes e jogos de luz e sombra que nos transportam para uma era mágica.

Recordo-me do impacto que senti ao contemplar esse palácio, com a Serra Nevada em fundo, como se ali estivesse condensada a grandeza de uma civilização que unia arte, ciência e espiritualidade. É um lugar cheio de luz, com jardins sumptuosos, de onde não saímos os mesmos que lá entrámos.

A civilização islâmica medieval foi uma das mais avançadas do seu tempo. Parece irreal, quando hoje nos deparamos com regressões civilizacionais e atentados aos direitos humanos (particularmente às mulheres), em muitos países muçulmanos. Mas, naquele tempo, enquanto a Europa cristã atravessava séculos de obscurantismo, o mundo muçulmano desenvolvia a matemática, a astronomia, a medicina e a filosofia, preservando e ampliando o conhecimento da Antiguidade Clássica. Esse legado chegou até nós, influenciando desde a forma como construímos as nossas cidades até palavras do nosso vocabulário quotidiano. E, mais do que isso, recorda-nos uma lição essencial: o progresso nasce do encontro entre culturas, da capacidade de aprender com o outro, de privilegiar a civilidade sobre a intolerância.

Neste tempo em que o mundo se vê tantas vezes dividido, vale a pena recordar que fomos sempre um povo de fronteiras abertas, de caminhos partilhados. Que esta edição da Portugalidade nos ajude a valorizar as nossas raízes e a reconhecer que a grandeza de uma nação se mede não pelo isolamento, mas pela riqueza dos laços que constrói com os outros.

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