Os Caminhos de Santiago de Compostela são cada vez mais procurados por peregrinos portugueses e não só. Do interior verdejante e rural ao azul refrescante do mar, Vila do Conde oferece aos peregrinos duas experiências distintas: o Caminho Português de Santiago Central – Porto e Norte e o Caminho Português de Santiago – Caminho da Costa.
Caminho Português de Santiago Central — Porto e Norte
O Caminho Português Central é dos percursos mais conhecidos e mais antigos, que liga o Porto a Santiago de Compostela, passando por Barcelos, Ponte de Lima e Valença. De acordo com a Oficina de Alcodiga El Peregrino, este foi o itinerário português mais usado pelos peregrinos em 2023. Os inícios das peregrinações remontam ao ano de 951, mas consta- se que a delineação do caminho ocorreu durante o Império Romano.
À saída do Porto há um rio para atravessar, o Leça. E se antes a travessia se fazia na Ponte da Azenha, depois da construção da ponte de Moreira, na Idade Moderna, o percurso sofreu algumas alterações para tornar o trajeto mais retilíneo e de forma a direcionar o peregrino até ao Mosteiro de Moreira, na Maia. Logo a seguir, entra-se então no concelho de Vila do Conde por Vilar do Pinheiro, seguindo- se os lugares Sete, Aradas e Padinho, em direção à freguesia de Mosteiró, onde se pode encontrar a sua igreja com altares barrocos e renascentistas. Nove Irmãos e Revilhões também são locais que ficam a caminho da freguesia de Modivas e, em Gião, cruza- se com um “templo imponente”, que é a sua igreja, assim caraterizada pelo azulejo que cobre a fachada, representando Santo Estevão e Santo António.
Chegando a Vairão não se é indiferente ao seu mosteiro e à sua história. Este existe desde 974 como instituição religiosa promovida pela nobreza, passando, mais tarde, a ser um mosteiro feminino. Hoje funciona como um albergue para peregrinos (e não só), situado no centro da aldeia e ideal para se entrar no espírito de peregrinação.
É então que se chega à margem sul do Rio Ave, através da ponte de D. Zameiro, construída no reinado de D. Afonso Henriques, durante o século XII, mas já reconstruída diversas vezes. Era a única que fazia a ligação entre Porto e Valença e continua, até hoje, a ter uma bela paisagem.
O percurso continua por Bagunte. Próximo, em Outeiro Maior, encontra-se a Casa da Quinta dos Cavaleiros, um “domus fortis” (modelo habitacional) da nobreza medieval de segunda linha, mas que pretendia ascender socialmente. A sua arquitetura, com soluções militares defensivas, demonstra ter sido utilizada em tempos instáveis.
Também não se pode deixar de visitar a Cividade de Bagunte, um povoado fortificado da Idade do Ferro, que tem vindo a ser alvo de investigações arqueológicas desde 1885. Foi possível entender que houve uma ocupação permanente entre os séculos IV a.C e IV d.C, o que levou a um processo de romanização.
Continua-se para S. Mamede e Casal de Pedro, até chegar à freguesia de Junqueira, onde se cruza com o Mosteiro de S. Simão (criado através da doação de elementos do clero e laicos, tendo D. Aires sido o primeiro Abade) e pela estalagem das Pulgas, local referido por Camilo Castelo Branco na sua obra “A Filha do Arcedigo” de forma depreciativa – “Nesse dia foram dormir a Casal de Pedro, e viram lá umas pulgas (…) que arrastam as meias dos passageiros, depois que lhes exaurirem as artérias d’um sangue azedado pelo maldito vinho (…)”.
Alcançando a Ponte de Arcos – uma ponte românica construída no reinado de D. Afonso Henriques e no Lugar da Lagoa, onde ali existia uma Lagoa (hoje extinta) – ultrapassa-se o Rio Este. Passa-se, em seguida, nas imediações da Igreja de S. Miguel de Arcos, posicionada numa pequena colina, e principal atração da localidade. Através da Rua do “Caminho do Porto”, o Caminho Português Central deixa Vila do Conde.
Já por ali passaram inúmeros peregrinos ilustres que documentaram a sua experiência, tais como Nicolau de Polielovo, em 1484; Jerónimo Munzer, em 1495; e Coondalonieri, em 1594.
Caminho Português da Costa
Este Caminho é uma variante do Caminho Central e ganhou mais visibilidade durante e após o século XV. A principal razão foi a atração com a zona costeira, por onde passa a maioria deste percurso, e onde foram construídos diversos apoios para quem viajava e passava por ali.
Ao optar por este caminho, a entrada em Vila do Conde faz-se novamente pela Maia, cruzando-se com a Igreja de Santiago de Labruge, ali presente desde 1058. O percurso continua com paisagens deslumbrantes, onde a atividade agrícola é predominante.
Chegar-se-á a uma zona mais florestal ao seguir em direção às “Almas Grandes”, um oratório de culto às almas purgatórias, construído no século XIX e que divide as freguesias de Modivas e Vila Chã.
A freguesia de Mindelo é o próximo destino, aproximando-se da orla costeira e cruzando mesmo a Reserva Ornitológica de Mindelo, a primeira reserva protegida em Portugal e que dispõe de miradouros e lugares de descanso, onde se pode observar mais 150 espécies.
O próximo destino é a Igreja Matriz de Azurara, para depois se atravessar uma ponte que liga à margem sul do rio Ave. É aí que existe um cruzeiro, onde está esculpida a Viera (símbolo de Santiago). O icónico Mosteiro de Santa Clara surge a seguir à ponte, em que a travessia era feita por uma barca até ao século XVIII.
Para continuar para Norte, o próximo destino é a Póvoa de Varzim, passando pela Igreja Matriz de Vila do Conde e entrando pela antiga Praça Velha, do Alto de Pega e da Poça da Barca. Até aqui foram 15,4km, o que corresponde a cerca de quatro horas para atravessar o concelho de Vila do Conde. Isto se não se parar para apreciar as paisagens do caminho e o muito que o concelho tem para oferecer a quem o visita.