Escrevia eu há pouco mais de um ano, no primeiro número desta revista, que “começar é sempre difícil, a frase mais vezes apagada e reescrita é tantas vezes a primeira”. Dependendo das situações, continuar, persistir, conservar, permanecer, consegue sê-lo ainda mais. É afinal o derradeiro teste a criaturas que, não sendo imortais, mantêm o fascínio por tudo o que é eterno.
É possível apreciar essa aspiração à eternidade na monumentalidade ou em algum legado histórico, por exemplo. Algo a que Napoleão apelou quando, no dia 21 de julho de 1798, proferiu a célebre frase, no Egito: “Soldados! Do topo destas pirâmides, 40 séculos vos contemplam!”
Mas é sobretudo na arte que a procuramos (a eternidade) e são, particularmente, os artistas que a encontram. Almas velhas e geniais, capazes de iniciar uma simples carta definindo o espaço onde a vão desenvolver como uma “larga e burguesa folha de papel” – Eça de Queiroz escrevendo a Ramalho de Ortigão.
Roberto Bolaño, o escritor chileno que, dizem, sempre sonhou ser poeta mas acabou romancista, teve a sua obra poética completa traduzida por Carlos Vaz Marques e publicada recentemente em Portugal pela Quetzal. Um dos seus poemas que tem por título “É melhor aprender a ler do que aprender a morrer”, tem um epílogo e moral da história que termina assim: “Ler é aprender a morrer, mas também é aprender a ser feliz, a ser corajoso.”
E qual é o exemplo maior da coragem para Bolaño?
“A poesia, mais corajosa do que ninguém
entra e cai
a prumo
num lago infinito como Loch Ness”
Tudo dito, mas temos monumentos e legado nas páginas que se seguem? Temos pois, e até Napoleão, ou pelo menos as suas tropas, derrotadas pelas Linhas de Torres, nas invasões a Portugal. E, tal como na primeira edição que referi no início deste texto, voltamos a ter Sintra na nossa capa, remetendo-nos para o “conto de fadas” que a paisagem deste município de rara beleza nos oferece. E ajudamos a manter viva a memória também na “Fronteira da Paz”, em Vilar Formoso, recordando valores de coragem e humanismo.
É assim que esperamos entrar em 2024, inspirados por palavras e sentimento inteiros, aprendendo “a ser feliz” e, sempre, “a prumo”.